Introdução
O abscesso hepático piogênico (AHP) é uma condição infecciosa grave caracterizada por uma coleção encapsulada de material purulento no fígado. Frequentemente, essa condição é resultante de infecções bacterianas, originárias do trato biliar ou de fontes intra-abdominais, como diverticulite. O manejo do AHP requer uma abordagem multidisciplinar, combinando diagnóstico rápido, antibioticoterapia e, em muitos casos, intervenção cirúrgica. No Brasil, a mortalidade associada a essa condição pode variar de 10% a 20%, sendo particularmente elevada em pacientes com comorbidades, como diabetes e cirrose. A presente revisão discute as abordagens cirúrgicas no tratamento do AHP, com ênfase nos critérios de intervenção, técnicas cirúrgicas e melhores práticas para o cirurgião do aparelho digestivo.
Diagnóstico e Classificação
O diagnóstico precoce do AHP é essencial para determinar a abordagem terapêutica mais adequada. Exames de imagem, como ultrassonografia (USG) e tomografia computadorizada (TC), são as ferramentas primárias para identificar a extensão da lesão e guiar a tomada de decisões. A classificação dos abscessos hepáticos baseia-se em seu tamanho e características morfológicas:
- Abscessos pequenos (menores que 3 cm) podem, muitas vezes, ser tratados com antibioticoterapia isolada.
- Abscessos maiores (geralmente >5 cm) e multiloculados exigem drenagem percutânea ou intervenção cirúrgica.
A etiologia do AHP no Brasil é predominantemente associada a bactérias como Escherichia coli e Klebsiella pneumoniae, e pacientes imunocomprometidos, como diabéticos, estão em maior risco de desenvolver complicações graves.
Abordagem Terapêutica
O tratamento do AHP é multimodal e deve ser adaptado à gravidade do caso, com o uso combinado de antibióticos, drenagem percutânea e intervenção cirúrgica, quando necessário. As diretrizes atuais propõem um algoritmo terapêutico baseado no tamanho e nas características dos abscessos.
1. Antibioticoterapia
A antibioticoterapia empírica deve ser iniciada imediatamente após o diagnóstico, visando cobertura para bactérias gram-negativas e anaeróbias. Ciprofloxacina ou cefixima combinadas com metronidazol são frequentemente utilizadas no manejo de abscessos hepáticos não complicados. A escolha do antibiótico deve ser ajustada conforme os resultados das culturas de sangue e de amostras do abscesso, garantindo uma abordagem personalizada.
2. Drenagem Percutânea
A drenagem percutânea, guiada por USG ou TC, é o tratamento de escolha para abscessos maiores que 3 cm e uniloculares (Tipo II). Esse método minimamente invasivo apresenta uma alta taxa de sucesso, próxima a 90%, sendo eficaz na maioria dos casos. No entanto, falhas podem ocorrer em abscessos multiloculados ou com conteúdo viscoso ou necrótico, situações em que a drenagem percutânea se torna inadequada, necessitando de intervenção cirúrgica.
3. Intervenção Cirúrgica
A cirurgia está indicada em abscessos multiloculados grandes (>3 cm, Tipo III), em abscessos que não respondem à drenagem percutânea ou na presença de complicações, como ruptura do abscesso. A cirurgia pode envolver drenagem minimamente invasiva ou ressecção hepática, dependendo da complexidade do abscesso e da experiência do cirurgião. Abscessos maiores que 10 cm apresentam maior risco de complicações, e nesses casos, a drenagem cirúrgica pode ser preferível. A laparotomia é recomendada em situações de peritonite ou quando o abscesso é de difícil acesso para drenagem percutânea.
4. Laparoscopia
A laparoscopia é uma alternativa minimamente invasiva à cirurgia aberta, indicada em abscessos uniloculares de tamanho moderado. Essa técnica oferece vantagens significativas, como menor tempo de internação e recuperação mais rápida, além de menor risco de complicações pós-operatórias.
Aplicação na Cirurgia Digestiva
O papel do cirurgião do aparelho digestivo é central no manejo dos abscessos hepáticos, especialmente em casos que requerem intervenção cirúrgica. A drenagem percutânea deve ser considerada a primeira linha de tratamento sempre que viável, mas o cirurgião deve estar preparado para realizar intervenções mais invasivas quando necessário. A laparoscopia tem demonstrado resultados promissores, reduzindo o tempo de internação e o risco de complicações. No Brasil, as infecções intra-abdominais complicadas são uma das principais causas de internação em emergências cirúrgicas, e o manejo adequado desses casos depende de uma sólida formação técnico-cirúrgica.
Algoritmo de Tratamento
Com base nas evidências disponíveis, um algoritmo de tratamento para o AHP pode ser delineado da seguinte forma:
- Abscessos pequenos (<3 cm, Tipo I): Tratamento com antibióticos isolados.
- Abscessos grandes uniloculares (>3 cm, Tipo II): Drenagem percutânea associada a antibioticoterapia.
- Abscessos grandes multiloculados (>3 cm, Tipo III): Intervenção cirúrgica.
Pontos-Chave
- Diagnóstico Precoce: O uso da TC com contraste é fundamental para o diagnóstico preciso do tamanho e da localização dos abscessos hepáticos, orientando a decisão terapêutica.
- Intervenção Cirúrgica: Abscessos multiloculados ou maiores que 5 cm frequentemente requerem intervenção cirúrgica, especialmente quando a drenagem percutânea falha.
- Abordagem Minimamente Invasiva: A laparoscopia oferece uma alternativa eficaz à cirurgia aberta, proporcionando uma recuperação mais rápida e com menor morbidade.
- Manejo Integral pelo Cirurgião Digestivo: O conhecimento técnico-cirúrgico é essencial para o manejo de abscessos hepáticos complexos, garantindo uma abordagem eficaz e personalizada.
Conclusão
O manejo do abscesso hepático piogênico exige uma abordagem multidisciplinar, sendo o cirurgião digestivo uma peça-chave no tratamento de casos complexos. A decisão entre drenagem percutânea e intervenção cirúrgica deve considerar múltiplos fatores, como o tamanho do abscesso, a resposta ao tratamento conservador e as condições clínicas do paciente. Como afirmou o Prof. Henri Bismuth: “Le traitement chirurgical n’est pas seulement une question de technique, mais de jugement. Le moment de l’intervention est aussi important que l’intervention elle-même.” Assim, o domínio técnico e a tomada de decisões precisas são fundamentais para o sucesso terapêutico no tratamento do AHP.
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