Introdução
O adenocarcinoma de pâncreas é uma das neoplasias mais agressivas do trato gastrointestinal, caracterizada por diagnóstico tardio, baixa ressecabilidade e alta taxa de recorrência. Apesar dos avanços técnicos e terapêuticos, a sobrevida global em 5 anos permanece inferior a 10%. A terapia neoadjuvante (quimioterapia com ou sem radioterapia antes da cirurgia) vem ganhando papel central, especialmente em tumores localmente avançados, borderline ressecáveis e, em casos selecionados, em tumores ressecáveis. Seu objetivo é tratar micrometástases precoces, aumentar taxas de ressecção R0 e selecionar pacientes com melhor biologia tumoral para cirurgia.
Racional da Neoadjuvância
- Controle sistêmico precoce: trata micrometástases antes da cirurgia.
- Seleção de pacientes: evita cirurgias em pacientes com progressão rápida da doença.
- Maior chance de completar quimioterapia: até 50% dos pacientes não recebem adjuvância após pancreatectomia devido à morbidade.
- Aumento da taxa de R0: margens negativas são fator prognóstico chave.
Evidências Recentes
- Borderline ressecável: ensaios mostram benefício claro. Regimes como FOLFIRINOX ou gemcitabina/nab-paclitaxel aumentam ressecabilidade e sobrevida global.
- Ressecáveis: ainda em estudo, mas meta-análises sugerem equivalência ou até superioridade em pacientes com alto risco prognóstico (ex.: CA 19-9 elevado).
- Radioterapia: pode melhorar controle local, mas seu papel isolado ainda é controverso.
O estudo PREOPANC (fase III, multicêntrico) demonstrou que quimiorradioterapia neoadjuvante não aumentou complicações maiores, fístula pancreática ou mortalidade pós-operatória, reforçando a segurança da estratégia.
Critérios para Indicar Neoadjuvância em Tumores Ressecáveis
- Marcadores de alto risco:
- CA 19-9 >150–250 U/mL
- Tumor ≥35 mm
- Albumina ≤3,5 g/dL
- Relação neutrófilo-linfócito ≥3,5
- Dupan-2 ≥750 U/mL
- Achados clínicos e radiológicos:
- Linfonodomegalia suspeita
- Invasão vascular incipiente
- Sinais sistêmicos de agressividade
- Preocupação com adesão ao adjuvante:
- Pacientes frágeis ou comorbidades que dificultem completar quimioterapia após cirurgia.
Taxa de Abandono da Neoadjuvância
- Varia entre 15–30% nos principais estudos.
- Motivos: toxicidade da quimioterapia, progressão tumoral, deterioração clínica ou recusa do paciente.
- Estratégia exige acompanhamento multidisciplinar próximo e suporte intensivo para reduzir perdas.
Segurança Cirúrgica
Estudos randomizados e coortes demonstram que a neoadjuvância não aumenta o risco de complicações pós-operatórias, incluindo fístula pancreática, infecção intra-abdominal e mortalidade hospitalar. Em alguns trabalhos, observou-se até redução da incidência de fístula pancreática clinicamente relevante.
Pontos-Chave para a Prática
- Padrão atual: recomendado em borderline ressecáveis.
- Ressecáveis: indicado em casos com fatores de alto risco.
- Regimes preferenciais: FOLFIRINOX (pacientes com bom performance status); gemcitabina/nab-paclitaxel em casos selecionados.
- Multidisciplinaridade é essencial: decisão deve envolver oncologia, cirurgia, radiologia e gastroenterologia.
Conclusão
A terapia neoadjuvante no adenocarcinoma de pâncreas representa um avanço significativo, transformando a abordagem tradicional baseada em cirurgia seguida de adjuvância. Atualmente, é padrão para tumores borderline ressecáveis, considerada em tumores ressecáveis com alto risco prognóstico, e investigada em ensaios clínicos como alternativa ao tratamento clássico. O futuro caminha para uma estratificação mais refinada baseada em biomarcadores, imagem funcional e resposta precoce ao tratamento, permitindo individualizar a neoadjuvância e maximizar o benefício oncológico.
“O futuro da cirurgia oncológica não é apenas retirar o tumor, mas entender a biologia da doença e intervir no momento certo.” — Veronesi
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Excelente postagem Prof. Dr. Ózimo Gama. Texto objetivo trazendo o que exiage com evidência científica atual. Parabéns.