Semiologia da Hérnia Abdominal: Avaliação Clínica e Manejo

Introdução

As hérnias da parede abdominal representam um desafio clínico comum na prática cirúrgica, demandando uma compreensão precisa da anatomia e uma habilidade cirúrgica refinada. Como observou Sir Astley Paston Cooper em 1804: “Nenhuma doença do corpo humano, pertencente à província do cirurgião, exige em seu tratamento uma melhor combinação de conhecimento anatômico preciso com habilidade cirúrgica do que a hérnia em todas as suas variedades.” Esta declaração permanece verdadeira até hoje, destacando a importância da semiologia adequada para o diagnóstico e manejo eficaz das hérnias abdominais.

Definição e Etiologia

Uma hérnia é definida como a protrusão anormal de uma víscera ou parte de uma víscera através de uma área de fraqueza em sua parede contendora. As hérnias podem ser classificadas em dois grandes grupos etiológicos:

  1. Congênitas: Associadas a distúrbios do desenvolvimento, como o processo vaginal persistente (hérnia inguinal infantil) ou falha na obliteração completa do anel umbilical (hérnia umbilical infantil).
  2. Adquiridas: Resultantes de fraqueza na parede abdominal, que pode ser consequência do envelhecimento ou de cirurgias prévias. O risco de hérnia aumenta em condições que elevam a pressão intra-abdominal, como levantamento de peso, tosse crônica, esforço ao urinar ou defecar, distensão abdominal, ascite e gravidez.

Composição da Hérnia

Uma hérnia abdominal é composta por três elementos principais:

  1. Saco Herniário: Revestimento peritoneal da hérnia, que pode ser completo ou incompleto, como observado nas hérnias deslizantes.
  2. Colo do Saco: Localizado ao nível do defeito na parede abdominal, onde a hérnia emerge.
  3. Conteúdo: Normalmente inclui alças intestinais ou omento.

Comportamento da Hérnia

As hérnias podem se comportar de diferentes maneiras, influenciando o manejo clínico:

  1. Redutível: O conteúdo herniário pode ser totalmente restaurado na cavidade abdominal, seja espontaneamente ou com manipulação.
  2. Encarcerada: Parte ou todo o conteúdo não pode ser reduzido devido a um colo estreito e/ou aderências, o que aumenta o risco de estrangulamento.
  3. Obstruída: Contém uma alça intestinal obstruída devido a um dobramento, que geralmente evolui para estrangulamento.
  4. Estrangulada: O suprimento sanguíneo ao conteúdo do saco herniário é interrompido, comumente no colo do saco. Isso pode levar à necrose intestinal e perfuração se não for diagnosticado e tratado precocemente.

Exame Clínico da Hérnia Abdominal

A avaliação de uma hérnia abdominal começa com uma história clínica detalhada, seguida de um exame físico minucioso.

História Clínica

  • É uma hérnia? A história de redutibilidade é crucial para o diagnóstico.
  • Localização: Identificar o local da protrusão.
  • Simples ou Complicada? Uma hérnia é considerada complicada se:
    • Encarcerada: O paciente não consegue mais reduzi-la.
    • Obstruída: Presença de sintomas de obstrução intestinal.
    • Estrangulada: Dor aguda e severa, obstrução intestinal, e o paciente está geralmente indisposto.
  • Fatores de risco: Avaliar a presença de fatores predisponentes, como levantamento de peso, DPOC, constipação, hiperplasia prostática benigna (HPB) e cirurgias prévias.

Exame Físico

  • Confirmar o diagnóstico e o tipo de hérnia: Verificar redutibilidade, impulso à tosse e localização anatômica.
  • Exame bilateral: Sempre examinar ambos os lados em casos suspeitos de hérnia inguinal.
  • Cicatrizes: Verificar a presença de cicatrizes que possam indicar hérnias recorrentes ou incisionais.
  • Exame geral: Essencial para identificar fatores predisponentes, como patologias intestinais e HPB.

Tomada de Decisão

A decisão de indicar uma cirurgia para o tratamento da hérnia depende de vários fatores, incluindo a presença de sintomas, o risco de estrangulamento (particularmente em hérnias com colo estreito), e a mobilidade e aptidão do paciente para a cirurgia.

Conclusão

A semiologia da hérnia abdominal é uma competência essencial para os cirurgiões e médicos em formação. Um exame clínico cuidadoso e uma compreensão profunda da anatomia e do comportamento das hérnias são fundamentais para o diagnóstico precoce e o manejo eficaz, prevenindo complicações graves, como estrangulamento e obstrução intestinal. A avaliação precisa e o manejo oportuno são fundamentais para melhorar os desfechos clínicos em pacientes com essa condição comum, mas potencialmente grave.

Como bem disse Sir Astley Paston Cooper:

“Nenhuma doença do corpo humano requer uma combinação melhor de conhecimento anatômico preciso com habilidade cirúrgica do que a hérnia.”

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